19 de maio de 2015

DEVANEIO NERD #1: LEITURA QUE TRANSFORMA

(Takagi Akito à direita e Moritaka Mashiro à esquerda)

A leitura pode influenciar a vida das pessoas e transformar sua visão de mundo, inclusive a leitura de quadrinhos. Pretendo mostrar meu ponto utilizando a metalinguagem presente no mangá Bakuman, da dupla de autores Takeshi Obata (Desenho) e Tsugumi Ohba (Roteiro), relacionando-o à narrativa Um General na Biblioteca, de Ítalo Calvino. As duas histórias mostram que, por meio da leitura, as pessoas podem mudar de uma maneira irreversível, se tornando capazes de questionar os preceitos e pressões da sociedade em que vivem, e a partir daí, conseguem ter mais autonomia e visão crítica do mundo.

Bakuman foi publicado no Japão entre 2008 e 2012 na revista Weekly Shõnen Jump e no Brasil em 2011 pela editora JBC. A história trata de dois jovens estudantes, Moritaka Mashiro e Takagi Akito, que querem se tornar mangakás, nome dado aos artistas produtores deste tipo de arte sequencial.

Mashiro tinha grande talento para desenho, mas estava desiludido por acreditar que estava condenado a ser mais um na sociedade. Mas tudo mudou no dia em que Mashiro conheceu o segundo protagonista, Takagi Akito, cuja especialidade era criar histórias densas, que levavam o leitor a uma maior reflexão.

Takagi fica impressionado com o talento de Moritaka e imediatamente propõe que a formação de uma dupla afim de começarem a produzir mangá. Mashiro acha que seria impossível para eles conseguir seguir a carreira de mangakás, principalmente por estar desiludido com a sociedade atual, mas também pela trajetória de vida de seu tio, Nobuhiro Mashiro, um mangaká que morreu de esgotamento enquanto trabalhava para lançar uma nova série em mangá.


Ao longo da história os garotos conhecem novos autores, cada um com seu próprio estilo e processo criativo, Mashiro e Takagi então criam uma relação de amizade, admiração e rivalidade com os outros autores e usam essa relação para motivarem um ao outro e terem novas influencias e inspirações.



Um General na Biblioteca narra uma história passada na nação fictícia de Panduria, um país altamente militarizado. Após o surgimento da suspeita, por parte dos oficiais superiores, de que os livros poderiam incitar o questionamento sobre a competência dos generais e suas motivações para as guerras, o Estado-maior de Panduria nomeou uma comissão de inquérito, comandada pelo general Fedina, para avaliar os livros da maior biblioteca daquele país e julgar quais são aptos para a leitura e quais ameaçam o poder do governo panduriano.

Fedina interdita a biblioteca e inicia a investigação, que contava com o auxílio de Crispino, o bibliotecário responsável pelo estabelecimento. Após leitura de cada um dos títulos da biblioteca, a obra era julgada e ao final de cada dia Fedina entregava um relatório aos seus superiores. Inicialmente grande parte do que os militares liam contrariava seus pensamentos e os deixavam irritados, sempre que isso acontecia Crispino se prontificava a mostrar-lhes mais títulos que discorriam sobre o assunto lido para expandir o conhecimento daqueles leitores.

Com o passar do tempo o número de livros lidos aumentava, contudo, o número de avaliações, fossem elas negativas ou positivas diminuía. Sempre que Fedina questionava algum subordinado sobre as ideias do livro que estaria lendo, o subordinado lhe respondia citando outros autores como forma de respaldar suas ideias.

“Se ele (Fedina), tentando controlar o trabalho dos tenentes, perguntava a um deles: – Mas como é que você deixou passar esse romance? Aqui a tropa se sai melhor do que os oficiais! É um autor que não respeita a ordem hierárquica! –, o tente lhe respondia citando outros autores, e embrenhando-se em raciocínios históricos, filosóficos e econômicos.” (p.77).

(Ítalo Calvino, Autor de "Um General na Biblioteca")

Por fim o general Fedina, com a ajuda de Crispino, decide expor os resultados de sua investigação, sua dissertação era uma espécie de compilação da história da humanidade, onde todas as ideias dos intelectuais de Panduria eram criticadas. Os militares envolvidos na investigação acabaram afastados por motivos de saúde. “O general e os quatro tenentes foram mandados para a reserva por motivos de saúde, por causa de ‘um grave esgotamento nervoso contraído no serviço’.”. Mas mesmo assim, eles ainda eram vistos entrando na velha biblioteca de tempos em tempos.

Podemos notar tanto em Bakuman, quanto na narrativa de Calvino, que os personagens principais iniciam com uma visão de mundo limitada, Mashiro se vê obrigado a seguir como gado humano pelo resto de sua vida, enquanto Fedina se encontra totalmente bitolado pelos ideais de Panduria. O que proporciona a mudança dos personagens é justamente o contato com a literatura, Fedina começa a questionar seu próprio país ao ter acesso aos livros que mostram pontos de vista diferentes dos seus superiores, sua visão de mundo muda para sempre e novas ideias e dúvidas surgem sempre em sua mente.

Mashiro é influenciado pelo tio, que era um antigo autor de mangás a ler sempre desde muito jovem, a partir daí ele tem o desejo ser mangaká também, esse sonho é reprimido após a morte de seu tio e então o garoto pensa que sonhar é loucura, que poderia apenas levá-lo à morte, mas Takagi consegue mudar esse quadro e fazer com que Mashiro sonhe novamente, viva plenamente e seja feliz. O momento que Mashiro está desiludido é justamente quando ele está afastado da literatura.

As duas obras mostram que a leitura e a produção de literatura têm o poder de mudar as pessoas e a forma como elas enxergam o mundo, além de dar uma motivação para que continuem vivendo. Um mundo onde a leitura é livre, a sociedade tende a ser mais justa e as pessoas conseguem ter uma empatia maior umas com as outras.


Quer saber mais sobre o tema desse Devaneio Nerd? Confira as indicações!
OHBA, Tsugumi; OBATA, Takeshi. Bakuman. Tokyo: SHUEISHA Inc., 2008.
CALVINO, Ítalo. Um General na Biblioteca, São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
Wikipedia, One-Shot. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/One-shot Acesso em 15 de janeiro de 2015.
Gyabbo, A metalinguagem idealista de Bakuman. Disponível em: https://gyabbo.wordpress.com/2011/12/08/a-metalinguagem-idealista-de-bakuman/ Acesso em 15 de janeiro de 2015.
Chuva de Nanquim, Review – Um choque cultural chamado Bakuman!. Disponível em: http://chuvadenanquim.com.br/2011/08/14/review-um-choque-cultural-chamado-bakuman/ Acesso em 15 de janeiro de 2015.


2 comentários:

  1. =D
    Muito bom!
    Tudo bem que o Mashiro tinha algumas motivações a mais pra desenhar rsrs, mas de fato a literatura é o maior influenciador!
    Ler é a melhor coisa do mundo. É o melhor jeito de viajar e sair do lugar sem sair de fato do lugar!

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    1. Pois é, o Mashiro é um personagem bem profundo, minha intenção é levar a galera a ler o mangá, mas não pude falar muito dele agora, mas calma que vem mais Bakuman por aí ;D

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